SBMFC entrevista Gustavo Gusso: vamos falar sobre Prontuário Eletrônico

18 de janeiro de 2019

SBMFC: Qual a importância do uso do prontuário eletrônico? 

Gustavo Gusso: O prontuário eletrônico é um registro de tudo o que a gente faz. Se não registrar a consulta, telefonema, conversa com paciente no corredor, esse contato não terá “existido”. Como trabalhamos de forma longitudinal, o prontuário eletrônico é uma entidade “viva”, que reage com um agente e ao ser alimentado e atualizado, fornece informações e armazena de forma ativa e contínua, não tem fim e é crucial para a MFC. 

 

SBMFC: Quais facilidades o prontuário proporciona no dia a dia do médico de família e comunidade? 

Gustavo Gusso:O prontuário eletrônico ajuda o profissional a ter um melhor cuidado. Ele proporciona ajuda não só com registro, alertas, protocolos inseridos, mas com um sistema de informação que devolve os dados aos médicos, quantos pacientes atendeu naquele dia ou na semana, e uma infinidade de ferramentas que podem ser bem direcionadas e utilizadas. 

Porém, é preciso usá-lo com atenção para não ser confuso, pois pode direcionar a um diagnóstico errado e faz com que toda a cadeia de cuidado seja arriscada e aumente a insegurança ao paciente.  

 

SBMFC: Atualmente, o prontuário eletrônico está acessível a todas as instituições? Como é feita a adesão? 

Gustavo Gusso: No Brasil, não. No SUS ainda está no papel em muitos lugares. E a principal dúvida dos gestores e gerentes das UBSs é não saber qual aderir. É uma decisão difícil. 

Nem sempre é fácil a decisão e as pessoas patinam. Muitas instituições brigam por preço e não sabem realmente qual prontuário elas querem. Às vezes, o gestor quer um tipo, mas o enfermeiro, médico querem outro. E, há casos que implementa um inadequado para a atenção primária, que não qualifica o trabalho desses profissionais. 

Se um gestor de uma UBS quiser aderir ao prontuário, ele precisa acionar a secretaria local e ter um conhecimento de um prontuário com ferramentas adequadas para a APS. 

Já tentamos fazer a certificação por meio do grupo de trabalho, não conseguimos avançar, mas é importante. Na nova edição do Tratado de Medicina de Família e Comunidade existe um capitulo específico, e lá tem uma descrição de como selecionar o prontuário ideal. O capitulo de Registro também fala disso. Ele completa o de prontuário.

A nova edição foi lançada em novembro de 2018 e está disponível na Artmed: https://loja.grupoa.com.br/tratado-de-med-de-familia-e-comunidade-2ed9788582715352-p1004499 

 

SBMFC: O uso do prontuário eletrônico é uma realidade no Brasil?            

 Gustavo Gusso: É uma realidade, mas não sabemos a porcentagem de uso. No SUS há capitais informatizadas como Curitiba e Florianópolis, mas algumas cidades têm zero adesão. Os prontuários mais modernos usam internet e nem toda unidade básica usufrui de estrutura. O Ministério da Saúde estava instalando a internet, mas ainda não tem em todas, mesmo necessitando de uma estrutura simples, como computador e internet.  No privado, a maioria está caminhando para a pelo menos a implantação do registro eletrônico. 

 

SBMFC: Como lidar com a confidenciabilidade dos dados do paciente em casos de prontuário eletrônico?                                            

Gustavo Gusso: O Brasil tem evoluído bastante, está atrasado em relação aos outros países, mas evoluindo por dois aspetos. A Sociedade Brasileira de Informática em Saúde e o CFM fazem uma certificação sobre segurança da informação e é preciso seguir um protocolo. E existe a lei que foi publicada em agosto do ano passado, a 13709/2018, que legisla exatamente sobre a segurança e a privacidade da informação e que vai nos ajudar a avançar nessa questão. E a certificação ajuda a dar essa garantia e minimizar os riscos da informação circular de forma inapropriada 

Além de ter o prontuário é importante ter o prontuário integrado para eles se falarem. É possível ter uma interoperabilidade. Porém, há uma observação: isso é natural acontecer em hospitais, mas não é uma obrigação e não é tão simples. É comum um prontuário trafegar pelo ambulatório e consultórios. Uma barreira muito comum é com os laboratórios. Se o paciente concordar, as informações devem trafegar para que ele mesmo seja o maior beneficiado. 

 

SBMFC: Quais países utilizam o prontuário eletrônico como case de sucesso?                                                 

Gustavo Gusso: Holanda e Finlândia têm uma integração incrível de prontuário. Na Holanda não se imprime receita, para se ter ideia. Ela vai direto para a farmácia de escolha do paciente. Mas Noruega Dinamarca, Espanha, Portugal, toda a Europa, na verdade, fazem bom uso do prontuário eletrônico. 

Historicamente, o primeiro país a registrar dados médicos eletronicamente foi o Estados Unidos, entre as décadas de 60 e 70. Não era bem um prontuário eletrônico, mas um computador para fazer um registro como DOS, com uma tela de exame. 

 

SBMFC: Há estudos e artigos publicados que comprovam os benefícios o uso do prontuário eletrônico?                                             

Gustavo Gusso: Existem sim. Mostram detalhes como impactos na segurança de dados, longitudinalidade e interação de medicamentos, separadamente. Estudos que mostrem os benefícios como um todo são difíceis de serem feitos pois há nem sempre se pode associar o beneficio como melhora do cuidado apenas ao prontuário. 

Entre os artigos publicados, temos na RBMFC o “Qualidade dos dados de assistência pré-natal na Atenção Básica em prontuário eletrônico e relação com apoio matricial, Vitória, Espírito Santo, 2013-2014: corte transversal”, que pode ser acessado pelo link: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/1612.

 

SBMFC: Os dados compilados no prontuário eletronicamente podem auxiliar e avaliar as doenças que mais atingem a população?                     

Gustavo Gusso: Isso é o que mais ajuda. O E-SUS tem dois aspectos. O prontuário no qual o médico insere o dado e tem o aspecto de integrador de dados. E as informações que insere nesse banco de dados integrado e pode receber de outros prontuários que é um banco de dados por trás dele. 

Os municípios não são obrigados a usarem a parte do prontuário do e-SUS, mas a parte da integração dos dados é uma exigência. Algumas unidades têm também o digitador, que recebe os dados dos pacientes atendidos e integram nesse sistema para compilação de dados nacionais. Com prontuário eletrônico há menor risco de perda da informação que vai direto para o integrador. 

 

SBMFC: Existem regras que regulamentam o uso? Alguma resolução do CFM?                                                

Gustavo Gusso: A Certificação da SBIS/CFM é mais para segurança do paciente. O CFM tem várias portarias que exigem registro e a guarda desse registro que pode ser só eletrônica. A lei de segurança e a cartilha são os principais.  

A Cartilha pode ser acessada pelo link:  https://portal.cfm.org.br/crmdigital/Cartilha_SBIS_CFM_Prontuario_Eletronico_fev_2012.pdf.

Sobre a resolução nº 1.639/2002do CFM: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2002/1639_2002.htm

 

Sobre o Grupo de Trabalho de Prontuário Eletrônico da SBMFC: 

SBMFC: Por que o GT foi criado? 

Gustavo Gusso: O Grupo foi criado em 2011, e desde então, tem se reunido nos congressos. O objetivo é fazer a certificação dos registros, conforme citado anteriormente. Atualmente, discutimos em uma lista de e-mails protocolos, estudos e artigos. 

SBMFC: Para participar, como o candidato pode ser inscrever?        

Gustavo Gusso: Para se inscrever, basta enviar um e-mail com solicitação para o e-mail: gtprontuario@sbmfc.org.br