Atuação do médico de família no atendimento da população indígena

17 de fevereiro de 2016

 Falta de acesso adequado  às zonas mais afastadas  dificulta  o atendimento de etnias que precisam de cuidados específicos com a saúde

 

 

Na formação de profissionais da área médica, pouco se fala sobre a situação da saúde em cenários rurais e até mesmo como é atendida a população indígena. No Brasil, a medicina de família e comunidade, especialidade que atua no cuidado das pessoas, da família e da comunidade no contexto da atenção primária à saúde. Ele acompanha as pessoas ao longo da vida, independentemente do gênero, idade ou possível doença, integrando ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde, é uma das responsáveis pelo atendimento a essa população.

 

Segundo o médico de família e membro da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), Bruno Pessoa, não existe uma preparação formal para atuar junto a esses povos. “Na maioria das faculdades de medicina pouco ou nada se fala sobre a saúde das populações indígenas ou de outras minorias, e é impossível existir uma preparação uniforme, afinal, cada etnia tem seus usos e costumes peculiares”. Além disso, poucos sabem que as secretarias estaduais da saúde nada têm a ver com a inserção do médico de família para atuar em comunidades indígenas; esse processo é realizado através de contrato terceirizado de Organizações Sociais junto aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs).

 

O médico de família atua inserido em uma equipe multidisciplinar de saúde indígena, que apesar de parecer com as equipes de saúde da família, possuem algumas peculiaridades. “Muitas vezes o médico de família é o único profissional da saúde acessível àquela população. A carteira de serviços oferecidos às populações pode variar de acordo com a formação de cada profissional, mas na maioria das vezes inclui consultas e procedimentos ambulatoriais, pequenas cirurgias e assistência ao parto”, explica Pessoa. É importante também que o médico saiba respeitar as tradições culturais, religiosas e de cura de cada etnia, para que haja uma melhor interação entre profissional e população atendida, a fim de melhorar a qualidade de vida desses povos.

 

Existem etnias indígenas de norte a sul do país, cada uma com um perfil de adoecimento diferente da outra, a depender do grau de contato, miscigenação, isolamento, e outros fatores relacionados à tradição e costumes. A prevenção de agravos também varia em cada população, desde um calendário vacinal distinto para os povos indígenas, até a manutenção do isolamento, para que seja possível evitar doenças infectocontagiosas desconhecidas pelo sistema imune daquela etnia.

 

O acompanhamento da população também difere de acordo com as características e costumes de cada região. Os índios nordestinos, por exemplo, têm um modo de vida que se aproxima das populações, devido ao processo de colonização. O planejamento de ação em saúde a essas etnias é diferente ao que é destinado aos índios da Amazônia isolada, por exemplo, em que o acesso se dá via fluvial após dias de viagem de avião, barco ou voadeira. De um modo geral, a saúde das populações rurais exige atenção e paciência por parte das equipes e gestores em saúde, a fim de, apesar das dificuldades, levar cuidados efetivos a essas pessoas.

 

Bruno Pessoa atuou como médico de família junto à etnia Xukuru do Ororubá, que vive na Serra do Ororubá, nos municípios de Pesqueira e Poção, Pernambuco. Conheceu mais sobre o atendimento médico a povos indígenas num congresso de educação médica em São Paulo, no qual descobriu sobre a experiência do estágio opcional. O médico afirma que “políticas públicas bem estruturadas precisam ser pensadas para que esses profissionais possam se fixar com facilidade nos locais onde é mais fácil o acesso às etnias atendidas, pois muitas vezes, a dificuldade de locomoção acaba por tornar difícil o atendimento aos povos, além de afastar os médicos da possibilidade de ingressar nessa experiência pouco conhecida na profissão”.