Nota da ABMFC sobre o enfrentamento à pandemia de COVID-19 no DF

14 de julho de 2020

A Associação Brasiliense de Medicina de Família e Comunidade (ABMFC), associação profissional de caráter científico que reúne médicos e médicas especialistas em medicina de família e comunidade (MFC) com atuação no Distrito Federal (DF) vem através desta nota expressar sua posição quanto ao relaxamento das medidas de distanciamento social anunciadas pelo governo do DF no último dia 2 de julho. 
 
É preciso considerar inicialmente que o governo do Distrito Federal está progressivamente reabrindo atividades comerciais e autorizando o retorno às aulas em um momento em que não preenchemos nenhum dos três critérios enfatizados pela Organização Mundial de Saúde(OMS) para orientar governos a decidirem pela flexibilização do distanciamento social. São eles: (1) quando há indicação de que a epidemia está controlada; (2) quando o sistema de saúde é capaz de atender uma ressurgência de casos; (3) quando o sistema de vigilância é capaz de identificar novos casos e seus contatos. 
 
Para pensar adequadamente na retomada de atividades, é fundamental responder às três questões que seguem: 
 
1) Há indicação de que a epidemia de COVID-19 no DF está controlada?
 
 Observando os dados oficiais da Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) é possível identificar que seguimos com um aumento crescente de novos casos e de óbitos por COVID-19 registrados nas duas últimas semanas. Em outras palavras: a epidemia de COVID-19 no DF não está controlada. 
 
2) O SUS DF é capaz de atender uma ressurgência de casos? 
 
A situação da epidemia no DF não nos permite ainda falar sobre “risco de ressurgência” pois não temos no momento nenhuma evidência de que a quantidade de novos casos esteja diminuindo. Portanto a “onda” atual da epidemia ainda não foi controlada. Mas será que ainda assim o SUS DF é capaz de atender uma quantidade crescente de casos (e consequentemente também de casos graves) nas próximas semanas? Novamente baseados nas melhores informações disponíveis, a resposta é não. A taxa de ocupação dos leitos hospitalares em unidades de terapia intensiva (UTI) no SUS segue bastante elevada, acima de 90% de ocupação de acordo com os levantamentos realizados pelo MPDFT a partir dos relatórios do complexo regulador. É perceptível nas últimas semanas, e dados do sistema de informação da APS demonstram isso, o aumento de pessoas com sintomas gripais procurando atendimento nas Unidades Básicas de Saúde, acompanhando o aumento da circulação e aglomeração de pessoas no período. O distanciamento social ainda é a principal medida para a redução do aumento de novos casos da doença, e o seu relaxamento o principal responsável pela aceleração da epidemia no DF. É extremamente preocupante que o governo distrital, em um momento em que claramente não estamos em uma situação de controle da epidemia, de forma contraditória, declare calamidade pública e reduza as restrições à circulação de pessoas. 
 
3) O SUS-DF é capaz de identificar novos casos e seus contatos? 
 
O DF continua abaixo dos parâmetros internacionais para testagem. Apresentamos importantes restrições ao acesso a testes para pessoas com quadros de síndrome gripal que não possuam outras condições de risco para COVID-19 e/ou para pessoas que tiveram contato com pessoas doentes. Nesse sentido, a identificação dos casos e de seus contatos não está acontecendo da forma desejada no Distrito Federal. Portanto, a partir do cenário exposto, a ABMFC posiciona-se contrária ao Decreto nº 40.939, de 2 de julho de 2020, que representa um retrocesso inoportuno das medidas de distanciamento social no contexto da pandemia de COVID-19.