SBMFC entrevista Denize Ornelas: comunicação gestão 2018-2020

25 de julho de 2020

*Denize Ornelas Pereira Salvador de Oliveira é médica de família e comunidade, Mestre em Saúde da Família pela Universidade Federal de São Paulo UNIFESP,  co-coordenadora do Grupo de Trabalho Mulheres na Medicina de Família e Comunidade da SBMFC (2019-2021). Atuou na SBMFC nas gestões 2014-2018  como Diretora de Exercício Profissional e em 2018-2020 na Diretoria de Comunicação. 

SBMFC: Como foi a experiência de atuar como diretora de comunicação da SBMFC? Qual foi o desafio maior para a comunicação durante a gestão? 

Denize: A vivência da Diretoria de Comunicação foi intensa e muito satisfatória. Tive a oportunidade de aprender muito sobre Comunicação em Saúde, Mídias, Redes Sociais e Tecnologia da Informação e claro, de Medicina de Família e Comunidade. O maior desafio pra mim foi conciliar minha carreira – que incluiu concluir meu mestrado durante a gestão – com a gestão de uma infinidade de temas, a integração das diretorias da SBMFC, associações estaduais, coordenações de GTs, editores da RBMFC e ainda apoiar nossa Assessora de imprensa no gerenciamento das nossas redes sociais, diariamente. Foi claro, cansativo, mas de um prazer imenso ver a repercussão de cada ação da Comunicação.

 

SBMFC: Como a comunicação da SBMFC colaborou com a especialidade nos últimos dois anos?

Denize: Acredito que a maior colaboração foi inserir cada um desses valores em cada conteúdo produzido, que era pensado para que não fosse só um “post, uma aparição da especialidade na mídia” mas que pudesse ser de fato utilizado outras vezes, como material de estudo e divulgação da especialidade para estudantes, residentes, médicas e médicos de família e comunidade (mFCs) e também – usuários e profissionais de saúde de todo país, dando identidade e valor social para a especialidade, de acordo com o nosso estatuto, atuando na defesa do SUS, seus princípios, diretrizes e qualificação assim como participar de ações de melhoria das condições de saúde da população brasileira.

Outro referencial fundamental foi utilizar a comunicação para ampliar a equidade de gênero, da defesa da diversidade e da representação da população negra, então trabalhamos nesse sentido ao por exemplo, junto com a Secretaria Geral, na época, Patrícia Chueiri, da inclusão no cadastro de associados dos campos para identificação ampliada de identidade de gênero e de raça/cor, conforme critérios do IBGE, o que esperamos que no futuro, gere dados mais consistentes de quem somos.

 

SBMFC: A comunicação não atua apenas nessa diretoria, mas a parceria com outras áreas é fundamental. Como foi a experiência e a importância dessa interação e parceria? 

Denize: É uma rede muito grande de contatos e parceiros que consolidamos e avançamos na maior parte das vezes, para comunicação em tempo real.

Com a impressa, faço questão de destacar que esse trabalho começa na gestão do meu antecessor no cargo, Rodrigo Lima, e com a manutenção da nossa Assessora de Comunicação, Ana Carolina D’Angelis. A continuidade das ações fez que com nosso trabalho amadurece ao longo desses dois anos, pudesse nor firmar como referência fonte perante a imprensa nacional, televisiva e escrita. 

Essa parceria inclui não só atendermos convites, mas a proativamente ofertamos releases, avisos de pauta que eram gerados no nosso grupo de comunicação, que incluiu além de mim, Rodrigo e o presidente Daniel Knupp. Assim, Ana Carolina tinha material para fazer contato com os produtores e jornalistas constantemente e o retorno vinha aí, em não só conseguirmos ser convidados, mas pautar a imprensa com os assuntos que achamos relevantes para especialidade. 

Em relação a comunicação interna, vivenciamos o fenômeno do aumento do número de Grupos de Trabalho em atividade após o 14. CBMFC em Curitiba, e foi de certa forma o que permitiu ampliarmos o número de mFCs que podiam ser fonte para a produção de conteúdo interno e fazer nossa interação como os usuários das redes sociais – os “seguidores” – aumentar e se somar as demandas já provenientes das mais de 20 associações estaduais e aos grupos de estudantes, residentes e mFCs que produzem conteúdo próprio com nossa chancela, como o Rural Seeds e o Causos Clínicos.

Outro papel dar publicidade a projetos feitos com parcerias externas – e isso inclui a interação com diferentes equipes de comunicação – um trabalho passa inicialmente pela diretoria e secretaria mas ao ser necessária divulgação, chega até a comunicação. Aí é necessário gerenciar muitas trocas de mensagens diariamente com entidades que têm parcerias com a SBMFC – desde às que somos filiadas como Wonca, CIMF, ABEM e irmãs, como SeyMFC passando pelo Ministério da .Saúde, Agência Nacional de Saúde Suplementar, Universidades (no Brasil e fora), as editoras de livros e de parceiros em projetos específicos com Sociedade Civil Organizada, que vão desde entidades estudantis a instituições como a Anistia Internacional do Brasil. 

 

SBMFC: Durante a gestão 2018-2020, vários eventos foram realizados. Tivemos o 15 CBMFC, além dos congressos regionais – Sul Brasileiro, Nordestino e Sudeste. Compartilhe a sua participação desde a organização até a cobertura em tempo real. 

Denize: Em 2019 em Cuiabá, além de fazer esse trabalho local, os meses antes foram muito importantes para atrair participantes através de conteúdos produzidos antes além de gerar uma cobertura que permitisse aos sócios que não puderam estar lá, acompanhar os principais debates do congresso. 

Em 2018 eu estive pessoalmente nos três congressos assim como nossa assessora de imprensa em um período de menos de 2 meses entre eles. Fizemos questão de que Ana pudesse fazer os contatos com a imprensa local atuando em parceria com as comissões locais, repercutindo das mídias locais as discussões que estavam sendo feita nos eventos. Em um deles tivemos que contornar uma crise local com um colunista que propagou uma informação equivocada sobre a locação do centro de convenções da Universidade e foi um trabalho intenso para garantirmos direito de resposta e zelar pela integridade da imagem tanto da Estadual organizadora quanto da SBMFC. Conto isso para que os sócios saibam que o trabalho da comunicação vai muito além de curtidas e likes, às vezes a gente literalmente “vira a noite” se preocupando em como resolver um problema com o poder da comunicação! 

E ainda durante a gestão tivemos encontros de vários Grupos de Trabalho – em alguns, o trabalho começava muito antes do encontro, pois oferecemos o apoio para produção de imagens para divulgação até aos certificados. Muitos, participei presencialmente, outros que monitorei à distância com a presença da nossa assessora: fazendo revisão de conteúdo, colaborando no processo criativo de, de perguntas para convidados serem entrevistados e gerando produtos que pudessem ser utilizados nos dias posteriores aos eventos.

 

SBMFC: Na gestão, o crescimento de seguidores nas redes sociais, principalmente no instagram, mostrou que o conteúdo agrega conhecimento e informação. Quais cuidados foram tomados na produção de textos e imagens? 

Denize: Uma meta que eu tinha em mente seguir era usar os princípios da Medicina de Família e Comunidade para nortear nosso trabalho, então todo o material tinha que ser clinicamente qualificado, orientado para as necessidades de saúde da comunidade, destacando sempre o papel do vínculo para a atuação das médicas e médicos de Família e Comunidade e da relação profissional-pessoa. Isso significou que o conteúdo científico temático tinha que ser referenciado, para além de ser dada uma opinião de especialista, nas melhores evidências científicas e atualizadas, além de enfatizar o nome e o princípios da especialidade corretamente. Meu papel era fornecer para nossa assessoria artigos e publicações de qualidade e fazer o papel de revisora de todo o conteúdo produzido. Todas as imagens passavam pela minha aprovação e por critérios de qualidade que tinham como sentido garantir a representação da diversidade, a inclusão e ser de nenhuma maneira, constrangedor para nenhum dos envolvidos. O trabalho de revisão de textos foi intenso e também foi compartilhado com Daniel Knupp, Rodrigo Lima, Patricia Chueiri e Giuliano Dimarzio (enquanto os dois últimos estavam na gestão).

 

SBMFC: Todo conteúdo produzido, inclusive pelos Grupos de Trabalho, foi publicado com as referências científicas. Mesmo o público das mídias sociais e site não sendo 100% da área da saúde, por que decidiu aplicar a Medicina Baseada em Evidências na comunicação? 

Denize: Primeiro porque o nosso compromisso enquanto sociedade científica com está no nosso estatuto, é promover o desenvolvimento da Medicina de Família e Comunidade e o aperfeiçoamento e o desenvolvimento profissional contínuo de médicos de família e comunidade e sabemos que mesmo não tendo força de “diretriz” oficial, o que publicamos é o que vai representar a especialidade, vai ser visto como “posição” dos mFCs. Então não só em temas polêmicos, por ex. o Novembro Azul e o Rastreamento do Câncer de Próstata em que nossa posição acaba conflitando com outros interesses, acredito ser fundamental não só ter uma produção socialmente referenciada, como qualificada e comprometida eticamente com a melhor evidência disponível – o que inclui, destaco sempre, a decisão compartilhada e a segurança do paciente. 

 Segundo, que por orientação acertada da nossa assessoria de imprensa, a credibilidade junto aos veículos de comunicação vêm desse trabalho sólido de poder mostrar seja para profissional da comunicação que vem influenciado por fontes às vezes duvidosas, que toda orientação médica tem riscos além dos benefícios imediatos, que há aspectos relacionados à preferência e desejos das pessoas, mas também a custos individuais e para o sistema de saúde. 

 

SBMFC: Por falar em grupos de trabalho, teve a parceria com a Diretoria Científica e de Desenvolvimento Profissional Contínuo para incentivar a publicação e produção. Como foi a tomada de decisões e as diretrizes estabelecidas? 

Denize: Esse é um trabalho ainda em curso e que precisa de muito aprimoramento. Diferente de outras sociedades de especialidade, que tem consolidado internamente subespecialidades, docentes e pesquisadores que lideram áreas e subáreas de pesquisa no CAPES, produzem vários livros, diretrizes etc., nossa especialidade ainda vem ganhando espaço e amadurecendo nesse sentido. Algumas diretrizes nossas são bem estabelecidas, como o não financiamento pela indústria farmacêutica, não só para eventos, mas para viagens, editoração e produção de conteúdo. 

Sobre a tomada de decisões, estamos ainda na segunda versão do regimento dos GTs, que para produção de conteúdo devem atuar em parceria com as duas diretorias, contando não só como nosso apoio, mas na minha compreensão, desde a etapa de elaboração do conteúdo à publicação do produto final, seja ele um evento ou uma publicação. 

Fomos aprendendo gradativamente a como fazer isso sem burocratizar fluxos mas ao mesmo tempo sem deixar de zelar pela qualidade – o que inclui desde a diagramação da identidade visual com diretrizes inclusivas, de diversidade, e equidade de gênero  até a revisão técnica baseada nas melhores evidências disponíveis.

Esse aprendizado está registrado em cada documento lançado, seja uma cartilha como as várias produzidas nesses últimos 2 anos, seja um artigo de opinião preparado para ser veiculado na imprensa até como foi o caso, na produção das Recomendações da SBMFC para APS durante a pandemia da Covid-19. Espero poder colaborar nessa continuidade com a nova gestão, como sócia e ex-diretora, entendendo que serão necessários ainda muitos ajustes até chegarmos ao uma forma ideal de funcionamento, dentro dos limites financeiros e operacionais que temos, visto que nossa única fonte fixa de renda é a anuidade dos sócios e a disponibilidade de tempo que mFCs dedicam seja como diretores, coordenadores ou membros de GTs.

 

SBMFC: Como foi ser uma das principais porta-vozes na imprensa da gestão 2018-2020, em veículos de de repercussão nacional? Foi necessária uma preparação? 

Denize: Com certeza a preparação começou com as sessões de treinamento de mídia que nossa assessoria fez nas gestões anteriores, quanto por morar em São Paulo, já ter sido acionada como Diretora de Exercício Profissional e Mercado de Trabalho. Então o início da gestão foi mais suave, sempre fiz questão de garantir um tempo bom para conversar com a produção antes, já que com os apresentadores a gente não fala, ouvir as orientações da nossa assessora e fazer o dever de casa ou seja: aprender com humildade quem é especialista na área de comunicação e estudar a pauta! Um dos conselhos mais sábios é falar o essencial é não brigar com o jornalistas – que assim como nós, tem qualidades e defeitos, dias bons e ruins mas estamos lá para fazer pontes e parcerias, não para brilhar mais que eles! 

 

SBMFC: A pandemia  Covid-19 chegou e a comunicação da SBMFC foi uma das áreas que mais sentiu impacto não apenas no sentido institucional, mas também com a imprensa. Conte um pouco sobre isso.

Denize: A pandemia mudou muita coisa nessa rotina pré gravação: realmente estar num estúdio para falar de um vírus e uma doença nova, com perguntas que não são roteirizadas é como estar numa consulta com um paciente novo, com nada no prontuário, o que dá um frio na barriga mas também uma sensação de estímulo intelectual intenso. Nós como generalistas sabemos que esse estímulo é gostoso, a diferença é que se você “errar”, vai estar errando na frente de milhares, até milhões de pessoas e pior, representado a sua entidade!

Então, de fato, o crescimento da exposição aumentou muito e a forma de exposição também o que me levou a estudar mais e me preparar ainda mais para as pautas, lento muitos artigos e estando sempre “em dia” com os principais programas jornalísticos. 

Quem assiste aos poucos minutos que passa numa reportagem, não sabe o tempo que levamos até a chegada no estúdio ou na locação, as orientações sobre o uso de roupas e adereços, maquiagem, posição frente às câmeras, uso do microfone. Existe muita diferença entre falar num programa ao vivo, num ambiente controlado, do que fazer uma matéria na rua para o Fantástico, por exemplo! Assim, ter a segurança no que ia ser conversado, pensar mais antes, ajudava no controle do estresse das outras situações que eram não controladas. Sou muito grata por ter vivido essa experiência, cresci muito profissionalmente! 

Em breve divulgaremos os relatório da Comunicação nesses últimos 2 anos e vamos ter um especial só para a pandemia da Covid-19!

 

SBMFC: Você atuou como diretora da SBMFC nas últimas três gestões (2014-2018 em Exercício Profissional e 2018-2020 na comunicação). O que te motivou a fazer parte da Sociedade de forma ativa? 

Denize: A paixão pela especialidade e pelo poder de mobilização social e mudança que ela tem! Eu realmente sou uma entusiasta da MFC e especialmente nessa última gestão, a minha escolha por estar na Comunicação foi o comprometimento com tudo que falei acima, principalmente com a visibilidade de temas que antes não eram tão evidentes e queria contribuir do lugar que me vejo no mundo: uma mulher negra, mãe, feminista, médica de família e comunidade que trabalha com educação de jovens e desde a graduação se pauta por uma medicina socialmente referenciada.

 

SBMFC: Além de atuar na diretoria, você é co-coordenadora do GT de Mulheres na MFC e membra ativa dos Grupos de Saúde da População Negra e Gênero, Sexualidade, Diversidade e Direitos da SBMFC, com contribuição na produção de materiais e organização de eventos. Como MFC, qual a importância de participar das discussões? 

Denize: Acredito que todos mFCs só ganham participando dessas discussões pois aumentam seu repertório para o cuidado clínico qualificado, podem aprender a exercer a tão falada advocacy, principalmente ampliando suas competências como defensores dos Direitos Humanos – não são pautas que se reduzem a identitarismo – são pautas que vem no bojo das mudanças que o mundo está vivendo, que as novas gerações de mFCs estão trazendo e demandando. A Medicina está pressionada pela sociedade a se atualizar, se modificar e por mais a gente se veja cercado de retrocessos, avançamos todos os dias na cibernética, na tecnologia da informação, o mundo não vai voltar para trás. A própria pandemia nos reposicionou no mundo, colocou em xeque a capacidade da medicina ser a única resposta em termos de evitar mortes – aparentemente evitáveis – pela própria contradição de que a medicina de excelência existir, parece ser necessário que ela seja para poucos, que ela seja uma forma de manter o status quo e muitas vezes, de  produzir desigualdade e opressão. E para entender tudo isso, se não for para ver o mundo mudar como expectador mas como protagonista, nós médicas e médicos podemos fazer mais que participar, temos muito que crescer nessas temáticas, produzir conhecimento e fazer pesquisa! Estamos vivendo A História! 

 

SBMFC: Quais são seus planos para os próximos meses?

Denize: Primeiro, escrever um – quem sabe dois? – artigos sobre comunicação, especialmente nos tempo de Covid-10.  Pretendo continuar atuando como docente e na residência, quero ingressar no doutorado, continuar atuando nos GTs da SBMFC que participo e seguir à  disposição para continuar sendo fonte da comunicação e auxiliando no que for possível e desejável, a gestão que se iniciou. 

 

SBMFC: Algo a complementar?

Denize: Sim! Agradecer, agradecer e agradecer! A minha família – especialmente meu marido que me apoiou em todo esse período e aos meus filhos que sempre demonstraram seu orgulho pelo meu trabalho, mesmo sentindo falta de mim, ao convite para estar na diretoria da SBMFC, em nome de Daniel Knupp e Thiago Trindade, ao aprendizado com os colegas de diretoria, dos GTS e especialmente, a poder ter trabalhado com Ana Carolina ver sua dedicação e carinho com a SBMFC – vou sentir muita falta dessa parceria! 

Por fim, agradecer a todos mFCS que colaboraram com a comunicação, que acreditam e investem na SBMFC, que nos mandaram críticas, elogios e me deram a oportunidade de representá-los. Obrigada, obrigada, muito obrigada.